Banco Central em xeque
- Reinaldo Stachiw
- 28 de mai. de 2024
- 2 min de leitura
Pôr em xeque a credibilidade do colegiado do Banco Central (BC) que define, a cada 45 dias, a taxa básica de juros da economia, como tem feito o governo, é um risco extraordinário e desnecessário. Risco que aumenta quando associado a cenários sobre os quais a autarquia não exerce nenhum controle, exatamente como o atual, marcado pela devastação do Rio Grande do Sul, que enfrenta a pior inundação de sua história, e a total indefinição sobre a evolução da taxa de juros dos Estados Unidos, a mais influente economia mundial.

Em participação no 10.º Seminário Anual de Política Monetária, da Fundação Getulio Vargas (FGV), o presidente do BC, Roberto Campos Neto, reconheceu que a escalada das expectativas de inflação pelo mercado tem sido “bastante ruim” para a atuação do Comitê de Política Monetária (Copom) na calibragem dos juros, mas o fato é que os analistas financeiros não param de revisar para cima suas projeções. Na mais recente edição do relatório Focus, que reúne 172 instituições, a expectativa para o IPCA subiu de 3,80% para 3,87% em 2024; de 3,74% para 3,75% em 2025; e de 3,50% para 3,58% em 2026.
Numa conjuntura desfavorável como a atual, é um despropósito acrescentar fatores de risco como o que tem cercado a mudança de comando do BC a mais de sete meses de sua efetivação. Ameaça alimentada pelo governo Lula da Silva com suas reiteradas críticas à política monetária e que alcançou o ápice na divisão entre indicados por Lula e por Bolsonaro na última reunião do Copom. Depois da desconfiança instalada, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, contribuiu para aumentar as dúvidas ao classificar como “exigentíssima” e “inimaginável” a meta de inflação de 3%.
O controle da inflação – que o BC persegue ao fixar os juros básicos – é imprescindível para manter nos trilhos uma economia instável e ainda muito carente de investimentos. Ainda são desconhecidas a dimensão e a duração das consequências da tragédia gaúcha nos preços de produtos alimentícios importantes, e o comportamento da inflação, tanto em 2024 quanto em 2025, estará intimamente ligado ao preço dos alimentos, como salientou Campos Neto. Portanto, neste momento é preciso redobrar a cautela para evitar o descontrole ao dobrar a próxima esquina.
A responsabilidade do Executivo para a boa administração da economia não é pequena e se baseia, em primeiro lugar, em manter o foco no equilíbrio fiscal. Somente tornando sólida a base é possível buscar mais investimentos, incentivar a melhoria de renda e garantir a ampliação do consumo. Mas o governo Lula da Silva parece disposto a seguir o caminho inverso, na ânsia de conquistar popularidade. Por óbvio, tentar atravessar na contramão não surtirá efeito.
Em entrevista ao Estadão, o economista José Julio Senna, chefe do Centro de Estudos Monetários do Ibre/FGV, declarou que a dificuldade da autoridade monetária em exercer o mínimo controle sobre as expectativas do mercado advém de questões fiscais e da mudança de comando na autarquia. Se não for pedir muito, é conveniente ao governo adotar uma atitude republicana no processo de transição.
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